Lançado há quinze anos, o ganhador do Óscar de Animação A Viagem de Chihiro (Sen to Chihiro no Kamikakushi/Spirited Away, 2001) tornou-se o filme mais popular do Studio Ghibli, é um filme que ainda hoje promove debates e discussões tanto na base de fãs de animação quanto de profissionais – parte disto se deve à quantidade de metáforas (muitas delas pouco compreensíveis ao grande publico, e em especial aos de outra cultura)
e subtextos presentes na obra de Hayao Miyazaki
Pois bem, um fã japonês cheio de questionamentos resolveu escrever para o Ghibli no inicio deste ano para tentar obter alguma luz. Surpreendentemente, levando-se em consideração a quantidade de cartas e e-mails que devem receber, o estúdio respondeu as suas indagações (link para o tweet original), que obviamente não pode se contentar em guardar isso para si e resolveu compartilhar com toda a fanbase – como qualquer outro fã o faria. Somos gratos por isso!
A carta explica que os pais de Chihiro se transformando em porcos simboliza como alguns seres humanos tornam-se gananciosos. O funcionário do Studio Ghibli que respondeu a carta, diz que de acordo com o diretor Hayao Miyazaki havia pessoas que “se transformaram em porcos” durante a bolha econômica do Japão da década de 1980, e essas pessoas ainda não perceberam que elas se tornaram porcos. “Essas pessoas são aquelas que dizem, ‘Nós estamos em uma recessão e não temos o suficiente para comer’”

Ele explica que após alguém se tornar um porco, essa pessoa não volta a ser humano, mas sim gradualmente começa a adquirir o “corpo e alma de um porco”, e que isto “não se aplica apenas ao mundo de fantasia”. 

Quanto ao porquê de Chihiro saber que seus pais não estão entre os suínos que ela deveria escolher para passar no teste que retorna para o mundo dos humanos, de acordo com a resposta da carta isso é explicado pela evolução da criança durante a viagem, cuja experiência a faz amadurecer e superar o teste final da bruxa.

“Chihiro, como uma menina de 10 anos de idade, pôde entender a diferença porque ela teve que superar as dificuldades e conseguiu adquirir a energia para viver - que é algo que todos podem fazer naturalmente”.

O escritor continua a explicar que o foco do filme não é em uma bela jovem heroína, ou uma pessoa com um coração único, mas uma menina cheia de incertezas que deve capturar a energia para viver, enfrentando seus medos.
Esta informação proveniente do Studio Ghibli nos dá uma compreensão ainda maior na sequência de um trecho de uma entrevista publicada online há alguns anos atrás, em que o próprio Miyazaki declarou que:
“Eu nunca explicou por que Chihiro sabe que seus pais não estão entre o grupo de porcos no final do filme. Essas pessoas que estão constantemente em busca de explicações, muitas vezes dizem que é ilógico. No entanto, eu não acho que esses tipos de coisas são importantes. Depois de todas as coisas que ela experimentou até esse ponto, Chihiro simplesmente sabe que seus pais não estão lá. Você pergunta por que ela sabe, mas o conhecimento está na vida humana. Isso é tudo”

Mas não são apenas essas indagações que muitas pessoas vinham fazendo sobre o filme há tempos. Houve especulações amplas sobre que tipo de comida os pais de Chihiro comeram antes que se transformarem em porcos (o alimento em questão pode ser visto na imagem superior esquerda incluída com o tweet de @0910noncha). O funcionário do Studio Ghibli, finalmente põe fim a esta especulação – ou não.

Na verdade, a resposta é que não há uma resposta. Destina-se a ser um mistério. A carta diz: “Na verdade não fica claro o que a comida é – é apenas muito deliciosa”

O autor da carta explica que, de acordo com a personagem Yubaba, é “comida para hóspedes”, por isso é tanto comida dos deuses quanto para seus convidados. No exato momento Chihiro diz que há algo estranho sobre esta cidade, seus pais se transformam em porcos. A carta diz que talvez esta não seja uma coincidência e a comida é, na verdade, “uma armadilha para capturar os seres humanos perdidos”.

Apesar disso, muitas pessoas já tinham tais respostas consigo mesmos, assim como suas próprias respostas. Uma das coisas mais interessantes sobre a arte é como ela foge do controle do seu criador, podendo até mesmo ganhar uma forma adversa àquele idealizada originalmente por ele, como já discuti aqui neste post.
Não foi a primeira vez que Miyazaki usa de simbologias metafóricas com animais, e especialmente se tratando de porcos, em Porco Rosso: O Ultimo Herói Romântico (1994) que é tido como semiautobiográfico, o velho Miya já flertava com o assunto ao criar um personagem que ganha a forma de um porco para protagonizar o longa.“prefiro ser porco a fascista”, dizia o Miya através do personagem. Caracterizado pelo diretor como “um filme para homens cansados de meia-idade”. Porco Rosso é uma crítica contra a guerra e seus absurdos, abordando a temática do mito do herói.

Fonte(s) RocketNews
Via     Elfen Lied Brasil